Ocupação de prédios: 3 meses de planos
Ligação clandestina garante luz para sem-teto em prédio ocupado (
André Lessa/AE)
Cristiane Bomfim
Sete minutos. Esse era o tempo calculado para a ocupação de quatro edifícios no centro de São Paulo na madrugada de segunda-feira, 4. As invasões simultâneas foram planejadas por três meses pela Frente de Luta por Moradia (FLM)e outros movimentos de moradia filiados. O primeiro passo foi a escolha dos edifícios vazios. Depois vieram as reuniões para decidir o dia e a hora da invasão. Em outros momentos, as pessoas do movimento passaram por treinamento em que era abordado desde a importância do movimento até as dificuldades de viver em uma ocupação e as regras da vida coletiva.
“Tínhamos sete minutos para derrubar uma parte da parede do prédio e começar a entrar antes que a polícia chegasse”, explica a coordenadora geral do Movimento Terra de Nossa Gente, Maria do Planalto, de 52 anos. O grupo é filiado ao FLM. O cálculo foi baseado no tempo em que uma viatura da base mais próxima chegaria ao local depois de ser acionada. A escolha do dia também foi estratégica: fim do primeiro turno das eleições, votos apurados e candidatos escolhidos por suas promessas para educação, saúde e moradia. “Era um bom momento para chamarmos atenção para este problema”, diz Maria.
Dos 15 ônibus e 8 vans estacionados na frente do número 925 da Avenida Ipiranga desceram 1.200 pessoas. A maioria vinda do bairro Alto Alegre, no extremo da zona leste. O relógio marcava meia-noite. Cerca de 15 homens quebraram a parede de concreto no soco. “A marreta não dava conta e tínhamos pouco tempo. Conseguimos fazer um buraco quando a polícia chegou. Aí fomos empurrando todo mundo pelo buraco”, explica José Lino da Silva, de 56 anos. Ele é um dos faz tudo da ocupação.
Dentro do prédio de 15 andares, os passos eram iluminados por lanternas e velas. “Além do poeirão, todos os quartos tinham montinhos de concreto, de resto de obra”, contou Paloma Clarice Ferreira Rodrigues, de 17 anos. Ela chegou ao local acompanhada do filho de 1 ano e a mãe.
Lâmpadas
Até as 15h de ontem não havia luz no prédio. Quando a reportagem do JT chegou ao local, o eletricista Fernando José da Silva, de 36 anos, tentava ligar a energia na companhia de mais dois homens. Puxa daqui, enrola dali. A primeira lâmpada acendeu na área onde foi montada a cozinha coletiva. Os fios foram comprados com o dinheiro da vaquinha.
“Demoramos muito tempo para conseguir achar a caixa de luz. E depois, não tinha fio. Está tudo feito no improviso, o que é bem perigoso. Pode ter curto-circuito ou alguém levar um choque”, explicou Fernando. Três fios entrelaçados subiam as escadas presos às paredes. Em cada andar foi ligada uma lâmpada nas áreas comuns.
Os pavimentos possuem oito apartamentos, dois não tem banheiro. “O que não faz muita diferença porque não temos água e muitos banheiros não tem nem privada”, contou Mariângela de Oliveira, de 38 anos. Por isso, usar banheiro só em bares do entorno ou albergues. Para banho a regra é a mesma.
Jornal da Tarde