A supermáquina do Metrô
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O megatatuzão vai abrir 6,4 km de túneis: começa o trabalho no Largo da Batata e acaba perto da Estação Luz
DANIEL GONZALES
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ENVIADO A SCHWANAU, ALEMANHA
De seus terminais de computador, em uma sala na pequena cidade de Schwanau, no sul da Alemanha, técnicos observam atentamente um gráfico colorido e dezenas de números. Os dados mostram, milimetricamente, a direção para onde avança uma máquina que está trabalhando naquele exato momento a 30 metros de profundidade, rasgando a terra do subsolo e abrindo o caminho para um futuro túnel de metrô. A velocidade e o desempenho dos trabalhos, com precisão, também são acompanhados pelos olhos atentos nas telas.
O fato parece corriqueiro numa grande obra, não fosse o fato de a escavação e os técnicos em questão estarem separados por uma distância de mais de 10.000 km: a máquina, trabalhando no subsolo de São Paulo, na região do Largo da Batata, em Pinheiros (Zona Oeste), operada por brasileiros. Os técnicos, observando tudo na mesma hora em uma sala na Europa.
Essa cena se tornará realidade em breve, quando chegar ao Brasil, no início do segundo semestre, o novíssimo "megatatuzão", comprado e construído especialmente para as obras de escavação de parte dos túneis da Linha 4 - Amarela (Luz - Vila Sônia) . A superescavadeira, chamada de shield EPB (Earth Pressure Balanced, ou escavadeira de pressão balanceada de terra), foi comprada na Alemanha pelo Consórcio Via Amarela, encabeçado pela construtora Odebrecht, que ganhou a licitação e vem construindo a linha, de 12,8 km, em 27 frentes de trabalho.
O megatatuzão será o responsável por abrir 6,4 km de túneis: começa seu trabalho no Largo da Batata e acaba em um poço próximo da Estação Luz, no Centro. A máquina custou cerca de 30 milhões de euros (R$ 79 milhões) e demorou cerca de dois anos para ser produzida. Já está montada e em fase final de testes antes de ser dividida em partes e trazida ao Brasil, numa operação de transporte que envolverá barcaças, navios e carretas de grandes dimensões.
Por enquanto, o equipamento descansa na fábrica da Herrenknecht AG, na Alemanha, uma das maiores indústrias do mundo de shields. Ali, foi vistoriado há duas semanas por diretores e engenheiros do Metrô de São Paulo e do Consórcio Via Amarela.
Diferentemente de máquinas semelhantes utilizadas ou em uso nas escavações dos túneis do Metrô paulistano, o novo equipamento ganhou o apelido de megatatuzão, primeiro, pelo tamanho: tem diâmetro de perfuração de 9,45 metros que permite cavar um túnel onde caberão as duas vias paralelas para os trens do Metrô, com diâmetro final de cerca de 8,3 metros. Os equipamentos antecessores conseguiram perfurar o diâmetro para uma via só.
Depois, porque além do monitoramento a distância, via modem, diretamente da fabricante - o que permite a solução instantânea de qualquer problema técnico - o megatatuzão dispõe de sistemas digitais que controlam com diferença quase igual a zero, em relação ao projetado, a trajetória no subsolo paulistano.
Trabalhando a 30 metros de profundidade e avançando, em média, 10 metros por dia, a máquina tem computadores de orientação de direção, que funcionam projetando um alvo de raio laser em vários pontos do solo a ser escavado.
(SERVIÇO)Viagem a convite do Consórcio Via Amarela e do Metrô.
Desafios debaixo da terra
Operação da escavadeira gigante exige planejamento minucioso
Operar uma máquina do porte do megatatuzão EPB no subsolo de São Paulo é uma tarefa complexa. Em cada uma das futuras estações, a máquina passará sendo rebocada em macacos especiais, em distâncias de 132 metros, para recomeçar a escavação na outra ponta. “Isso exige sincronismo para que as estações já estejam escavadas e com estrutura externa quando o tatuzão chegar naquele ponto”, explica o engenheiro Fábio Gandolfo, diretor da Odebrecht.
Entre as estações, os espaços dos túneis, conforme forem sendo abertos, serão preenchidos por anéis de concreto, fabricados dentro do túnel mesmo por outra máquina também comprada na Europa. Cada um dos anéis de revestimento interno que se encaixam uns nos outros tem largura de 1,5 metro e pesa 4 toneladas. Um anel é instalado por hora e é preciso uma reserva de três meses antes de o megatatuzão começar a operar na Cidade.
A Linha 4 - Amarela deverá vencer até desafios como passar sete metros abaixo da Linha 2 - Verde (Vila Madalena - Imigrantes). Na construção das estações, duas técnicas estão sendo empregadas: a NATM, que primeiro faz uma laje de teto e depois escava embaixo, e a VCA, ou vala a céu aberto, escavada de cima para baixo. As Estações Luz, Higienópolis, Paulista, Oscar Freire, Pinheiros e São Paulo-Morumbi serão construídas pelo método NATM. República, Fradique Coutinho e Faria Lima serão em VCA.
Uma odisséia para transportar
Máquina de quase 2 mil toneladas vai fazer viagem de dez dias por mar para chegar
Como transportar uma máquina de 1.800 toneladas, quase 10 metros de diâmetro e 75 metros de comprimento, da Alemanha até o Brasil? A tarefa leva menos tempo do que pode parecer - apenas 10 dias de navio - mas envolve um planejamento logístico que demanda o transporte em barcaças e grandes carretas para materiais pesados, para a subida da Serra do Mar pela Via Anchieta e transporte dentro da Cidade até o Largo da Batata. Além de manter contato com concessionárias das rodovias e com a CET, o Metrô já trabalha na expedição de guias de importação e documentos aduaneiros para o transporte.
Nos próximos dias, o megatatuzão começa a ser desmontado e separado em cinco partes. Será totalmente embalado em plástico antes do transporte. Da fábrica, em Schwanau (Alemanha), segue até a cidade de Kehl, também na Alemanha, perto da fronteira com a França. Dali, segundo o planejamento do Metrô, seguirá numa barcaça pelo Rio Reno até Rotterdam, na Holanda.
É no porto holandês que a máquina será novamente embarcada em um navio para cruzar o Oceano Atlântico numa viagem de cerca de 10 dias até Santos. Chegando ao Brasil, as peças exigirão várias viagens de carretas especiais até a Capital, onde o megatatuzão vai ganhar vida novamente, depois de montado, parte por parte, em Pinheiros. Essa montagem, segundo o Metrô, vai levar cerca de um mês.
SOB MEDIDA PARA O SOLO PAULISTANO
>>O megatatuzão EPB comprado para o Metrô de São Paulo, foi produzido sob medida para o tipo de solo paulistano onde ele vai escavar.
>>Com base em estudos, segundo o engenheiro Fábio Gandolfo, diretor da Odebrecht, é que foram feitas as especificações técnicas para a construção da máquina. A primeira delas, há 10 anos.
>>Do local onde ficará a futura Estação Faria Lima (Avenida Brigadeiro Faria Lima) até a futura Estação Fradique Coutinho (na rua de mesmo nome, perto da Av. Rebouças), o solo tem presença de rochas.